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24 de Abril de 2024

Motorista que sofreu sequelas múltiplas em acidente de trânsito receberá R$ 150 mil

Publicado por Paulo Antonio Papini
há 9 anos

A 1ª Câmara de Direito Civil do TJ majorou indenização por danos morais e estéticos a um homem que sofreu múltiplas sequelas após acidente de trânsito registrado em uma madrugada do verão de 2002. O autor da ação receberá R$ 150 mil. Ele teve seu carro abalroado por um motorista que conduzia outro veículo em completo estado de embriaguez.

Como resultado, o homem teve seu automóvel destruído, perdeu o emprego e sofreu graves ferimentos, com reflexos para o restante da vida. Laudos médicos apontaram lesão cerebral irreversível, além de cicatrizes de monta distribuídas por quase todo o corpo.

"Ele sofreu transformação na sua imagem, na sua fala e no seu caminhar, transformação esta que atingiu a sua autoestima e contribuiu para o seu estado depressivo", consignou o desembargador Raulino Jacó Brüning, relator da apelação, ao contestar o valor arbitrado em 1º grau, de R$ 35 mil. Os prejuízos materiais havidos foram quitados sem discordância no transcurso do processo original. A decisão foi unânime (Ap. Cív. N. 2011.017601-1).

Fonte - Tribunal de Justiça de Santa Catarina - http://portal.tjsc.jus.br/web/sala-de-imprensa/-/motorista-que-sofreu-sequelas-multiplas-em-acidente...

Veja abaixo o acórdão:

Apelação Cível n. 2011.017601-1, de Taió

Relator: Des. Raulino Jacó Brüning

APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRÂNSITO. TENTATIVA DE ULTRAPASSAGEM MAL SUCEDIDA. COLISÃO FRONTAL. LESÃO CEREBRAL IRREVERSÍVEL, CICATRIZES, PERDA DE ENTE QUERIDO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE À SEGURADORA. ACOLHIMENTO PARCIAL DA PRETENSÃO INICIAL. 1.RECURSO DOS RÉUS. 1.1. PRELIMINAR. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. INTIMAÇÃO REGULAR PARA COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. PRELIMINAR AFASTADA. 1.2.MÉRITO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO CONFIGURADA. IMPRUDÊNCIA DO CONDUTOR DO VEÍCULO ADVERSÁRIO VERIFICADA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS ESTÉTICOS E MORAIS. STJ, SÚMULA N. 387. 1.3. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 2.RECURSO DA SEGURADORA. 2.1. LIMITAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO AOS VALORES DE COBERTURA DA APÓLICE. COBERTURA PARA DANOS ESTÉTICOS INCLUSA NA RUBRICA DANOS CORPORAIS. 2.2. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PENSÃO CIVIL DECORRENTE DE ATO ILÍCITO COM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. 2.3. JUROS DE MORA CONTADOS A PARTIR DO EVENTO DANOSO. STJ, SÚMULA N. 54. 2.4. CABIMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA LIDE SECUNDÁRIA. OPOSIÇÃO DE RESISTÊNCIA QUANTO AOS LIMITES DA COBERTURA SECURITÁRIA. 2.5. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 3. PONTO DE IRRESIGNAÇÃO COMUM. QUANTUMINDENIZATÓRIO QUE DEVE OBSERVAR OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. CARÁTER INIBITÓRIO E COMPENSATÓRIO. 3.1.RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, PARA AUMENTAR O VALOR DA INDENIZAÇÃO A PATAMAR CONDIZENTE COM A OFENSA PRATICADA E A CAPACIDADE ECONÔMICA DAS PARTES.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2011.017601-1, da comarca de Taió (Vara Única), em que são apelantes e recorridos adesivos Allianz Seguros S. A. E outros e apelado e recorrente adesivo Francisco Marcos Cordova Pereira e outros:

A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos do autor e dos réus, e conhecer parcialmente do apelo da litisdenunciada; negar provimento aos recursos dos réus e da litisdenunciada; dar provimento parcial àquele interposto pelo autor, para majorar o quantum indenizatório referente aos danos morais e estéticos para R$ 100.000,00 (cem mil reais) e R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), respectivamente. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido por este Relator e dele participaram os Desembargadores Domingos Paludo e Gerson Cherem II.

Florianópolis, 21 de maio de 2015.

Raulino Jacó Brüning

PRESIDENTE E Relator

RELATÓRIO

Adoto o relatório da r. Sentença de fls. 379/386, da lavra do Doutor Renato Guilherme Gomes Cunha, por refletir fielmente o contido no presente feito, in verbis:

Cuidam os presentes autos de ação condenatória aforada por Eder Ivan Martins em face de Francisco Marcos Cordova Pereira e João Vitor Pereira, visando ao ressarcimento de danos decorrentes de acidente de veículos no valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais).

Alegou o autor que no dia 12 de janeiro de 2002, às 03:15 horas, na rodovia BR 422, conduzia seu veículo VW/Parati, placas LXQ-5455, quando na altura do km 172, foi abalroado de frente pelo veículo Fiat/Pálio, placas LZQ-7349, de propriedade de Francisco Marcos Cordova Pereira (1.º requerido) e conduzido por João Vitor Pereira (2.º requerido); o veículo conduzido pelo 2.º requerido efetuou uma ultrapassagem forçada sem tomar os devidos cuidados, o que causou a colisão; do acidente o requerente restou gravemente lesionado; o 2.º requerido foi levado à Delegacia de Polícia onde foi constatado que estava alcoolizado; ao dirigir alcoolizado e ao realizar a manobra de ultrapassagem indevida o 2.º requerido agiu com imperícia, imprudência e negligência; o 1.º requerido na qualidade de proprietário do veículo deve responder por todos os danos causados pelo 2.º requerido; o requerente ficou incapaz para as ocupações habituais por mais de 30 dias e perdeu o emprego em que recebia R$ 720,00 (setecentos e vinte reais) mensais; o requerente é o efetivo proprietário do veículo VW/Parati, mas apenas não registrou a transferência no órgão de trânsito; o requerente perdeu parcialmente a função da fala, a mobilidade da mão direita e restaram diversas cicatrizes em seu corpo; o veículo do requerente ficou totalmente destruído, sendo que era avaliado em R$ 4.000,00 (quatro mil reais); o requerente teve gastos hospitalares no valor de R$ 1.109,00 (mil cento e nove reais), gastos com transporte e viagens no valor de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), gastos com tratamento como fonoaudiólogo e psicólogo no valor de R$ 660,00 (seiscentos e sessenta reais) além do valor do veículo, totalizando os gastos materiais no valor de R$ 6.969,00 (seis mil novecentos e sessenta e nove reais); o requerente restou incapacitado para o trabalho devendo receber uma pensão mensal vitalícia; os requeridos devem ser condenados ao pagamento dos valores que o requerente deixou de receber, tomando como base sua última remuneração no valor de R$ 720,00 (setecentos e vinte reais), a título de lucros cessantes; em decorrência do acidente restaram várias cicatrizes e o requerente apresenta dificuldade em caminhar devendo receber trezentos salários mínimos de indenização por dano estético e que a indenização pelos danos morais sofridos não deve ser inferior a quinhentos salários mínimos.

Foi designada audiência de conciliação e determinada a citação do requerido.

Às fls. 105 o requerente aditou a inicial juntando rol de testemunhas.

Citados, os réus apresentaram resposta em forma de contestação, requerendo inicialmente a denunciação da lide da AGF Brasil Seguros S/A, nos termos do artigo 70, inciso III, do Código de Processo Civil; alegaram que a culpa é do autor uma vez que conduzia o veículo com excesso de passageiros; o veículo do autor vinha sendo conduzido pela faixa central da pista, sendo que a culpa do acidente é do autor; o 2.º requerido não estava alcoolizado; o pedido de indenização por dano moral deve ser julgado improcedente uma vez que os requeridos não são culpados pelo acidente ou que a culpa deve ser reconhecida na forma concorrente; o valor máximo de indenização não deve ser superior a cem salários mínimos; não foi comprovado o recebimento do valor de R$ 720,00 (setecentos e vinte reais) por parte da vítima o que implica na improcedência do pedido de lucros cessantes e que devem ser descontados deste valor os rendimentos do autor juntos ao INSS; os documentos referentes aos danos materiais não comprovam as despesas, não podendo ser julgado procedente o pedido neste sentido.

Impugnando a contestação o requerente alegou que a denunciação da lide é devida e repisou os argumentos apresentados na inicial.

O pedido de denunciação da lide foi deferido e foi determinada a citação da denunciada.

A litisdenunciada AGF Brasil Seguros S/A não contestou o feito deixando transcorrer in albis o prazo para tanto.

Às fls. 137 foi deferida a produção da prova oral e pericial sendo designada data para a realização da audiência de instrução e julgamento.

Por ocasião da realização da audiência foi reconhecida a revelia dos réus e da denunciada uma vez que os primeiros foram intimados pessoalmente sob pena de confesso (fls. 140 a 141), e a segunda não contestou. Foi deferida ainda a indisponibilidade de valores e determinando o seqüestro no rosto dos autos n. º 054.02.001958-4/001.

A perícia foi realizada e juntada às fls. 289-291.

A litisdenunciada apresentou contestação às fls. 296-343 alegando que foi reconhecida a revelia mas que a litisdenunciada pode intervir no processo em qualquer fase; sua responsabilidade deverá ficar limitada aos valores constantes no seguro de responsabilidade civil; nos autos 054.02.003748-5 (Comarca de Rio do Sul) está sendo discutido o mesmo acidente a mesma cobertura securitária; a sentença de primeiro grau foi procedente e os autos encontram-se em grau de recurso; se a sentença for confirmada é possível que não reste qualquer importância para ser utilizada no presente feito; a responsabilidade da litisdenunciada é regressiva e de reembolso, não podendo ser condenada conjuntamente com os requeridos; não cabe sua condenação em honorários advocatícios; o valor recebido pelo autor referente ao seguro DPVAT deve ser deduzido de eventual condenação; em relação ao pedido de indenização do valor do automóvel, eventual valor da condenação deve ser compensado do valor obtido pelos salvados (sucata); as despesas de deslocamento não foram comprovadas; deve-se descontar o valor recebido pelo autor do INSS a título de auxílio doença de eventual condenação por lucros cessantes; não é possível a cumulação de pedidos de dano estético e dano moral; o dano moral difere do dano corporal sendo que a responsabilidade da seguradora a título de danos morais era de R$ 6.000,00 (seis mil reais); o valor do pedido de indenização por danos morais é muito elevado, estando fora dos parâmetros adotados em casos semelhantes, devendo ser reduzido para 20 salários mínimos; em caso de deferimento do pensionamento, os honorários advocatícios deverão ser fixados sobre o valor das prestações vencidas, mais um ano das vincendas e não sobre o valor da condenação.

Foi determinada a intimação do autor e da litisdenunciada para apresentarem alegações finais e se manifestarem acerca da perícia e da contestação juntada aos autos.

Foram apresentadas as alegações finais.

Foi determinado que fosse certificado o trânsito em julgado dos autos n.º 054.02.003748-5 e que fosse juntada cópia do acórdão.

Foi deferido parcialmente o pedido de produção de prova e foi determinada a expedição de ofício à Superintendência de Seguros Privados - SUSEP para que no prazo de 10 dias informe a este juízo se o autor formulou pedido de recebimento de seguro DPVAT e em caso afirmativo, qual o valor efetivamente pago (grifos acrescidos).

Acresço que o Magistrado a quo julgou parcialmente procedente a pretensão indenizatória, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com fundamento nos artigos acima citados, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, CONDENANDO FRANCISCO MARCOS CORDOVA PEREIRA, JOÃO VITOR PEREIRA e ALLIANZ SEGUROS S/A no pagamento ao requerente de R$ R$ 6.969,00 (nove mil novecentos e sessenta e nove reais) a título de danos materiais, com juros de mora (0,5% ao mês até a vigência do Novo Código Civil e, partir de então, 1% ao mês) e correção monetária (INPC) desde a data do acidente; bem como ao pagamento de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) e R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de danos morais e estéticos, respectivamente, com juros de mora (0,5% ao mês até a vigência do Novo Código Civil e, partir de então, 1% ao mês) desde a data do acidente e correção monetária (INPC) desde a data da prolação desta sentença (Súmula 54 do STJ), descontado o valor de R$ 4.727,81 (quatro mil setecentos e vinte e sete reais e oitenta e um centavos) e pensão vitalícia no valor de R$ 720,00 (setecentos e vinte reais), desde o evento danoso. As parcelas vencidas deverão ser pagas de uma só vez, devendo sofrer correção monetária desde cada vencimento, que fixo dia 30 de cada mês, sendo a primeira em 30/02/2002, até o efetivo pagamento. Sobre o referido valor deve incidir juros de mora de mora (0,5% ao mês até a vigência do Novo Código Civil e, partir de então, 1% ao mês); e com base no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, RESOLVO O MÉRITO.

Tendo em vista que o requerente restou sucumbente apenas no que dizia respeito aos lucros cessantes, que eram pleiteados no montante de R$ 304,00 (trezentos e quatro reais) reconheço a sucumbência de parte mínima e condeno os requeridos no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 20% do valor da condenação, nos termos do artigo 20, § 3.º, do Código de Processo Civil.

Em relação à lide secundária, condeno a litisdenunciada ao pagamento das custas processuais (em havendo) e honorários advocatícios, estes fixados em 20% do valor da condenação ao requerente, com base no artigo 20, § 4.º e 3.º, do Código de Processo Civil, respectivamente.

P. R. I.

Inconformada, Allianz Seguros S. A. Interpõe recurso de apelação, reforçando a tese de que a sua responsabilidade deve ficar adstrita aos valores de cobertura estipulados na apólice de seguro. Assim, no seu entender, o seu limite para indenização por danos morais e estéticos deve ser fixado em R$ 6.000,00. Observa, também, que há outra ação judicial em tramitação (autos n. 054.02.003748-5), versando sobre os mesmos fatos e envolvendo o mesmo contrato de seguro, razão pela qual a cobertura pode ser integralmente utilizada naquele feito. Aduz que o quantum indenizatório fixado a título de reparação por danos morais e estéticos extrapola os valores usualmente estabelecidos em casos semelhantes ao presente. Sustenta que o dies a quo para a incidência de juros de mora e correção monetária deve ser estabelecido na data da prolação da sentença. Alega, por fim, que o valor da pensão mensal recebida pelo lesado deve ser deduzido do seu benefício previdenciário e que os honorários de sucumbência fixados na lide secundária devem ser excluídos ou atrelados ao valor de cobertura da apólice de seguro, e não ao valor da condenação (fls. 390/409).

Igualmente irresignados, os réus interpõem recurso de apelação. Em preliminar, argumentam que não possuem condições de arcar com as despesas processuais, sobretudo com o preparo do recurso, razão pela qual requerem a concessão do benefício da justiça gratuita. Ainda em preliminar ao mérito, argúem a nulidade da sentença, uma vez que não foram regularmente intimados para comparecer à audiência de instrução e julgamento. No mérito, repetem a tese de culpa exclusiva ou, quando muito, concorrente, da vítima. Afirmam, ainda, a inexistência de danos estéticos e a impossibilidade de cumulação de indenização por danos morais com estéticos. Postulam, ao final, a redução da verba indenizatória para o total de R$ 10.000,00 (fls. 415/426).

O Magistrado a quo deferiu o benefício da justiça gratuita (fl. 429).

O autor ofertou contrarrazões e, ato contínuo, recurso adesivo, pugnando pela majoração da indenização por danos morais para R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) e por danos estéticos para R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) (fls. 433/443).

A seguradora apresentou contrarrazões, reiterando os argumentos expostos na apelação (fls. 446/450).

Os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

VOTO

Os recursos são tempestivos. O apelo da empresa seguradora está munido de preparo e os demais estão dispensados em razão do deferimento do benefício da justiça gratuita.

1. Recurso dos réus

1.1. Cerceamento de defesa

Inicialmente, cumpre afastar a alegação de nulidade da sentença por cerceamento de defesa.

Os requeridos invocam a nulidade da sentença, sob a assertiva de que não foram regularmente intimados para comparecer à audiência de instrução e julgamento e, por tal razão, foram considerados revéis.

De fato, o Magistrado singular entendeu que os réus "incidiram nos efeitos da revelia", nos termos dos arts. 277, § 2º, e 319, ambos do Código de Processo Civil (fl. 389).

No entanto, não há razão para a decretação da revelia, uma vez que os réus compareceram à audiência preliminar e, frustrada a tentativa de acordo, apresentaram a peça defensiva (fls. 114/124), conforme prescreve o art. 278 do Código de Processo Civil, que trata da sequência dos atos processuais no procedimento sumário.

Ocorre que, posteriormente, foram intimados para comparecer à audiência de instrução e julgamento, e, todavia, as correspondências foram devolvidas sem cumprimento, uma porque o destinatário não foi encontrado e a outra porque o endereço informado não foi suficiente para efetuar a intimação (fls. 145/146).

Também foram intimados, na pessoa do seu procurador legal, por meio de publicação no Diário da Justiça (fls. 125 e 144).

Em suma, foram regularmente cientificados da prática do ato processual e permaneceram silentes.

A propósito:

Art. 236. No Distrito Federal e nas Capitais dos Estados e dos Territórios, consideram-se feitas as intimações pela só publicação dos atos no órgão oficial.

[...]

Art. 238. Não dispondo a lei de outro modo, as intimações serão feitas às partes, aos seus representantes legais e aos advogados pelo correio ou, se presentes em cartório, diretamente pelo escrivão ou chefe de secretaria.

Parágrafo único. Presumem-se válidas as comunicações e intimações dirigidas ao endereço residencial ou profissional declinado na inicial, contestação ou embargos, cumprindo às partes atualizar o respectivo endereço sempre que houver modificação temporária ou definitiva.

Deste modo, não há falar em revelia, tampouco em cerceamento de defesa por ausência de intimação acerca da realização da audiência de instrução e julgamento.

Sobre o tema, colhe-se da jurisprudência desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESPEJO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA AFASTADA. FIRMA INDIVIDUAL QUE SE CONFUNDE COM O PROPRIETÁRIO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DAS PARTES PARA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. PROCURADOR INTIMADO VIA PUBLICAÇÃO OFICIAL. NÃO COMPARECIMENTO INJUSTIFICADO. CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE. NÃO REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA PRELIMINAR (ART. 331 DO CPC) E AUSÊNCIA DE DESPACHO SANEADOR. IRREGULARIDADES NÃO RECONHECIDAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO DEMONSTRADO. DESPEJO FULCRADO NO TÉRMINO DA RELAÇÃO DE TRABALHO QUE SUSTENTAVA O CONTRATO DE LOCAÇÃO. ART. 47, II, DA LEI N. 8.245/91. DESNECESSIDADE DE SE PERQUIRIR SE O PACTO LABORAL FOI RESCINDIDO COM OU SEM JUSTA CAUSA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

[...] Não ocorre cerceamento de defesa quando, apesar de intimado, o procurador das partes deixa de comparecer injustificadamente à audiência de instrução, ainda que as partes não tenham sido pessoalmente intimadas. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2008.006820-2, de Campo Erê, Relator Des. Jorge Luis Costa Beber, julgada em 07/06/2011).

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. CARÊNCIA DE AÇÃO. MATÉRIA APRECIADA EM DESPACHO SANEADOR. PRECLUSÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE. AUSENTE A RÉ E SEU PROCURADOR NA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. FALTA DE INTIMAÇÃO SOMENTE DA RÉ, CUJO ADVOGADO FOI INTIMADO. DEVER DE COMPARECER REPRESENTANDO SUA CONSTITUINTE. PRELIMINAR INACOLHIDA. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. REQUISITOS LEGAIS DEMONSTRADOS (CPC, ART. 927). ESBULHO CONFIGURADO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO REINTEGRATÓRIO. RECURSO DESPROVIDO.

Não há cerceamento do direito de defesa quando, apesar de não intimada a ré para comparecer à audiência de instrução e julgamento, seu procurador, devidamente intimado, não comparece à audiência, sem provar seu impedimento. (TJSC, Apelação Cível n. 2009.061236-9, de Tijucas, Relator Des. Luiz Carlos Freyesleben, julgada em 08/06/2010).

Cumpre ressaltar que, embora o Togado singular tenha aplicado os efeitos da revelia, o feito estava instruído com farta prova documental e técnica, mostrando-se pronto para julgamento.

Neste contexto, é de ser afastada a preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa.

1.2. Responsabilidade pelo evento danoso

Em relação à responsabilidade pelo acidente que vitimou o autor, os réus, ora apelantes, sustentam que a colisão teria ocorrido por culpa exclusiva da vítima, que trafegava com mais cinco passageiros no veículo e na faixa central da rodovia.

Pois bem.

Como cediço, o caso em apreço deve ser analisado à luz da responsabilidade subjetiva e segundo as disposições do Código Civil de 1916, uma vez que o acidente ocorreu em 12 de fevereiro de 2002.

O diploma em vigor à época dispunha:

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, arts. 1.521 a 1.532 e 1.542 a 1.553.

[...]

Art. 1.5718. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outros ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação.

Depreende-se da norma - atualmente inscrita nos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil - que o ilícito civil pressupõe: (a) uma ação ou omissão, culposa ou dolosa; (b) um dano com repercussão material e/ou imaterial; (c) relação de causalidade entre a conduta do agente e o resultado lesivo.

Ora, o acidente em questão restou incontroverso nos autos.

O boletim de acidente de trânsito apenas reforçou as alegações das partes no sentido de que Éder Ivan Martins transitava pela rodovia SC-422 na madrugada do dia 12 de fevereiro de 2002 quando invadiu a pista contrária para efetuar uma manobra de ultrapassagem e colidiu frontalmente com o veículo conduzido por João Vitor Pereira.

Retira-se do documento:

"Declaração do condutor do veículo n. 2 (João Vitor Pereira):

Declarou o condutor do V-2 que transitava pela SC 422, sentido Taió à BR 470, quando na altura do km 172 ao ultrapassar um veículo à sua frente deparou-se de frente com o V-1, colidindo frontalmente com o mesmo, não podendo assim evitar o acidente" (fl. 29).

O Código de Trânsito Brasileiro é cristalino ao dispor:

Artigo 29. O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas:

[...]

X - todo condutor deverá, antes de efetuar uma ultrapassagem, certificar-se de que:

[...]

c) a faixa de trânsito que vai tomar esteja livre numa extensão suficiente para que sua manobra não ponha em perigo ou obstrua o trânsito que venha em sentido contrário; [...]

Observa-se que os documentos e relatos constantes dos autos, inclusive os do próprio réu, evidenciam a sua imprudência no momento do acidente, pois estava dirigindo às 3h15min, certamente com a visibilidade reduzida, numa rodovia estadual com pistas simples, e não agiu com a cautela necessária ao efetuar uma manobra arriscada como a de ultrapassagem. Deixou de se certificar se havia distância suficiente antes de invadir a pista contrária para ultrapassar o carro à sua frente. Acaso estivesse dirigindo com a atenção e o cuidado exigidos por lei, teria total condição de evitar a colisão, simplesmente retardando a manobra.

Em julgamentos semelhantes ao presente, consignou-se:

Sabe-se que a ultrapassagem só pode ser realizada em locais que permitem tal manobra, sendo que, também, o condutor deverá observar se pode efetuá-la com segurança.

Assim, via de regra, sinistros que se dão na contra-mão de direção de veículo ao transpassar um terceiro são de responsabilidade daquele que efetuava a manobra, pela atenção e certeza necessárias intrínsecas ao sucesso do movimento (TJSC, Apelação Cível n. 2011.010989-0, de Guaramirim, Relator Des. Eduardo Mattos Gallo Júnior, julgada em 18/11/2014).

Age com culpa, sob a modalidade imprudência, o condutor de veículo que realiza manobra arriscada na pista de rolamento com a intenção de realizar ultrapassagem mas vem a colidir com veículo da pista contrária, que é arremessado e colide com o veículo que trafegava na traseira do automóvel causador do infortúnio (TJSC, Apelação Cível n. 2009.075350-0, de Caçador, Relator Des. Gilberto Gomes de Oliveira, julgada em 13/11/2014).

Vale ressaltar que o boletim de ocorrência informa que o réu estava sob a influência de bebida alcoólica, e, da mesma forma, o exame de corpo de delito, realizado às 8h45min, ou seja, mais de cinco horas após o acidente, atesta que ele estava com hálito alcoólico, circunstâncias que agravam ainda mais a sua culpa (fls. 29 e 126).

O fato de o autor estar trafegando com mais cinco pessoas no veículo (fl. 28) não tem o condão de excluir a responsabilidade dos réus, pois não há nos autos qualquer indício de que tal infração administrativa tenha contribuído para o acidente.

Por fim, quanto à alegação de que a vítima estaria dirigindo na faixa central da rodovia, o croqui constante do boletim de ocorrência comprova o contrário, que estava transitando na sua mão de direção (fl. 32).

Em resumo, não há falar em culpa exclusiva ou concorrente da vítima, restando configurada tão somente a culpa do réu João Vitor Pereira, que conduziu o veículo imprudentemente, e, ainda, a responsabilidade solidária de Francisco Marcos Córdova Pereira, proprietário do veículo, e Allianz Seguros S. A., empresa seguradora do veículo.

1.3. Danos estéticos e possibilidade de cumulação com danos morais

Os apelantes também afirmam que as cicatrizes oriundas do acidente não teriam o condão de causar constrangimento ao apelado, ou seja, não haveria dano estético passível de ser indenizado.

Ora, compulsando-se as fotografias de fls. 156/159, os laudos médicos e fonoaudiológicos de fls. 44/45, 49/50, 168/169 e 173/176, e o laudo pericial de fls. 289/291, verifica-se que o acidente automobilístico provocou uma lesão cerebral irreversível no autor, que comprometeu a sua fala e a sua marcha. Também deixou cicatrizes no seu rosto, barriga e membros inferiores. O expert consignou expressamente que as lesões podem ser consideradas "deformidade ou aleijão permanente" e que "apresenta consequência de natureza estética". Segundo o laudo fonoaudiológico de fl. 173, o requerente foi diagnosticado com "disartrofonia: trata-se de uma alteração motora na fala que, nesse caso, é decorrente de traumatismo craniano".

Em suma, afora o abalo moral experimentado pelo demandante, que restou incontroverso, observa-se que ele também sofreu danos de ordem estética, pois houve uma transformação na sua imagem, na sua fala e no seu caminhar, transformação esta que atingiu a sua autoestima e contribuiu para o seu estado depressivo.

No que diz respeito à possibilidade de cumulação das indenizações por danos estéticos e morais, melhor sorte não socorre os apelantes.

É que há entendimento sedimentado acerca do assunto, distinguindo o dano estético do dano moral e, por conseguinte, autorizando a sua cumulação mesmo quando derivados do mesmo fato danoso, pois embora ambos possuam caráter extrapatrimonial, as suas naturezas são completamente distintas. Assim, a indenização por danos morais objetiva reparar uma ofensa à honra, à dignidade, um sofrimento físico ou psíquico. Já a indenização por danos estéticos visa recompensar uma perda física, anatômica, uma transformação negativa na aparência da vítima.

Neste sentido, colhe-se da doutrina de Flávio Tartuce:

Os danos estéticos são tratados atualmente tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência como uma modalidade separada de dano extrapatrimonial, o que está de acordo com a tendência de reconhecimento dos novos danos, de alargamento da razão anterior. O dano estético é muito bem conceituado por Teresa Ancona Lopez, uma das maiores especialistas do assunto em nosso País. Ensina a professora da USP que: "Na concepção clássica, que vem de Aristóteles, é a estética uma ciência prática ou normativa que dá regras de fazer humano sob o aspecto do belo. Portanto, é a ciência que tem como objeto material a atividade humana (fazer) e como objeto formal (aspecto sob o qual é encarado esse fazer) o belo. É claro que quando falamos em dano estético estamos querendo significar a lesão à beleza física, ou seja, à harmonia das formas externas de alguém. Por outro lado, o conceito de belo é relativo. Ao apreciar-se um prejuízo estético, deve-se ter em mira a modificação sofrida pela pessoa em relação ao que ela era" . Para a mesma doutrinadora, portanto, basta a pessoa ter sofrido uma "transformação" para que o referido dano esteja caracterizado. Tais danos, em regra, estão presentes quando a pessoa sofre feridas, cicatrizes, cortes superficiais ou profundos em sua pelé, lesão ou perda de órgãos internos ou externos do corpo, aleijões, amputações, entre outras anomalias que atingem a própria dignidade humana. Esse dano, nos casos em questão, será também presumido (in re ipsa), como ocorre com o dano moral objetivo. Repise-se que o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo há tempos que o dano estético é algo distinto do dano moral, pois há no primeiro uma "alteração morfológica de formação corporal que agride a visão, causando desagrado e repulsa". Já no dano moral há um "sofrimento mental - dor da mente psíquica, pertencente ao foro íntimo". O dano estético seria visível, "porque concretizado na deformidade" (STJ, REsp 65.393/RJ, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 30.10.2005 e REsp 84.752/RJ, Min. Ari Pargendler, j. 21.10.2000). Consolidando esse entendimento, o teor da Súmula 387 do STJ, de setembro de 2009: "é lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral" (Manual de Dirieto Civil: volume único, 2 ed., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2012, p. 465).

Para por fim a qualquer dúvida, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 387, que diz: "É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral".

Neste contexto, também devem ser rejeitadas a alegações de ausência de configuração de dano estético e de impossibilidade de cumulação das indenizações por danos estéticos e morais.

2. Recurso da seguradora

2.1. Limitação do quantum indenizatório ao valor de cobertura previsto no contrato de seguro

Em seu apelo, a seguradora pugna pela limitação da sua responsabilidade aos valores de cobertura veiculados na apólice. Consigna expressamente que a cobertura para danos morais e estéticos contratada é de R$ 6.000,00 (seis mil reais), que correspondem a 10% (dez por cento) do somatório dos danos materiais e corporais.

Pois bem.

A responsabilidade solidária da seguradora, limitada ao valor de cobertura contratado, restou incontroversa nos autos.

O pedido de limitação da indenização por danos morais e estéticos em R$ 6.000,00 (seis mil reais), contudo, não pode ser acolhido.

Explica-se.

A apólice em questão, acostada à fl. 310, oferece garantia para:

Casco - 100% da tabela FIPE

Danos Materiais - R$ 30.000,00

Danos Corporais - R$ 30.000,00

Danos Morais - R$ 6.000,00

Morte - R$ 5.000,00

Invalidez Permanente - R$ 5.000,00

O contrato de seguro, por seu turno, distingue os danos materiais dos danos pessoais, definindo aqueles como prejuízos patrimoniais decorrentes de danos causados a bens tangíveis (veículos, imóveis, etc) e estes como prejuízos patrimoniais decorrentes de danos sofridos por pessoas (doença, invalidez, morte, etc) (fl. 333). E também afirma que os danos morais estão incluídos na modalidade danos pessoais (fl. 341).

Em resumo, nada especifica acerca dos danos estéticos.

Sendo assim, forçoso concluir que o limite para indenização por danos morais é, de fato, R$ 6.000,00 (seis mil reais). Este montante foi taxativamente delimitado pelos contratantes.

O limite para indenização por danos estéticos, porém, não pode ser confundido com o relativo aos danos morais. E na ausência de previsão explícita na apólice, os danos estéticos devem ser incluídos na rubrica danos corporais. Logo, o limite deve ser fixado em R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Em precedentes semelhantes ao presente, este Tribunal de Justiça já se posicionou:

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. [...] RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA. DELIMITAÇÃO DAS COBERTURAS. LIMITES GLOBAIS DA APÓLICE. DANOS ESTÉTICOS ENGLOBADOS NA RUBRICA DANOS PESSOAIS E CORPORAIS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSOS DOS RÉUS E DA SEGURADORA LITISDENUNCIADA CONHECIDOS E DESPROVIDOS. APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2011.069758-4, Rel. Des. Sebastião César Evangelista, julgada em 19.03.2015).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRÂNSITO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE À SEGURADORA. [...]. RECURSO DA SEGURADORA. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS NÃO CONTRATADOS. IMPERTINÊNCIA. DANOS ABRANGIDOS PELOS DANOS CORPORAIS AJUSTADOS. [...]. É entendimento consolidado nos Tribunais Pátrios que havendo contratação na apólice de seguros de cobertura para danos corporais, esta deve servir para o pagamento da indenização por danos morais, por serem estes espécie de danos corporais. Demais disso, a cobertura contratada na apólice prevalece sobre eventual cláusula de exclusão constante das condições gerais do contrato (TJSC, Apelação Cível n. 2014.080566-1, Rel. Des. Saul Steil, julgada em 16.12.2014).

Ainda que exista previsão nas condições gerais da apólice de seguro que os danos morais e estéticos não serão indenizados, em atenção aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, a empresa seguradora somente se eximirá do pagamento em caso de expressa anuência do segurado. Mesmo porque, o normal quando alguém contrata um seguro é fazê-lo de forma abrangente, descurando-se de especificidades acerca das inúmeras hipóteses de exclusão da cobertura unilateralmente impostas pela seguradora e que, por vezes, contrariam a própria destinação maior do contrato aderido. (TJSC, Apelação Cível n. 2012.070098-7, Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, julgada em 23.10.2012).

2.2. Dedução da pensão mensal decorrente de ato ilícito do valor do benefício previdenciário

A sentença também deve ser confirmada no tocante à possibilidade de cumulação da pensão mensal decorrente de ato ilícito com a aposentadoria por invalidez recebida pelo autor, uma vez que as verbas possuem naturezas distintas.

Aliás, aqui também há entendimento sedimentado na jurisprudência.

A propósito:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS, MORAIS E PENSÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. - PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. (...) PENSÃO. APOSENTADORIA PREVIDENCIÁRIA PRÉVIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. REDUÇÃO DA CAPACIDADE DE TRABALHAR NA MANUTENÇÃO DO LAR. REPERCUSSÃO ECONÔMICA DA OFENSA. PENSIONAMENTO DEVIDO. - A fixação de pensão mensal em razão de ato ilícito é cabível mesmo na hipótese de a beneficiária ser aposentada, porquanto verbas de natureza e fins distintos. STJ, REsp 402443/MG, rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, rel. P/ Acórdão Min. CASTRO FILHO, DJ 01/03/2004 (Apelação Cível n. 2012.048064-5, de Criciúma, rel. Des. Henry Petry Junior, j. 31.10.2013)

Vale enfatizar que o recebimento de benefício previdenciário pela vítima não diminui a responsabilidade civil do causador do dano.

Não obstante o entendimento consignado por este Relator no Agravo de Instrumento n. 2013.067128-7, de Araranguá, julgado em 18.9.2014, aqui trata-se de hipótese sensivelmente distinta, uma vez que, após cognição exauriente, assentou-se cabalmente a responsabilidade civil dos ora apelantes, conforme exposto acima.

Ressalta-se, ademais, que a pensão mensal decorrente de responsabilidade civil não se confunde com o benefício previdenciário da pensão. Tais verbas possuem natureza e fins distintos, motivo pelo qual é plenamente possível a cumulação.

Sobre as matérias aqui tratadas, importante precedente do Superior Tribunal de Justiça:

RECEBIMENTO DOS VENCIMENTOS PELA ENTIDADE PREVIDENCIÁRIA E MANUTENÇÃO DO CARGO SEM REDUÇÃO DE VENCIMENTOS. PENSÃO. CABIMENTO.

1. O art. 950 do Código Civil não exige que tenha havido também a perda do emprego ou a redução dos rendimentos da vítima para que fique configurado o direito ao recebimento da pensão. O dever de indenizar decorre unicamente da perda da capacidade laboral, que, na hipótese foi expressamente reconhecida pelo acórdão recorrido.

2. A indenização de cunho civil não se confunde com a aquela de natureza previdenciária. Assim, é irrelevante o fato de que o recorrente, durante o período do seu afastamento do trabalho, continuou auferindo renda através do sistema previdenciário dos servidores públicos.

3. A indenização civil, diferentemente da previdenciária, busca o ressarcimento da lesão física causada, não propriamente a mera compensação sob a ótica econômica.

4. A análise da existência do dissídio é inviável, porque não foram cumpridos os requisitos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ.

5. Recurso Especial provido.

(STJ, REsp 1062692/RJ, Min. Nancy Andrighi, j. Em. 4/10/2011)

Neste mesmo sentido: TJSC, Apelação Cível n. 2011.034695-5, Des. Sebastião César Evangelista, j. Em 20/11/2014 e TJSC, Apelação Cível n. 2014.004668-3, Des. João Batista Góes Ulysséa, j. Em 23/10/2014.

Deste modo, a pretensão de dedução do valor da pensão mensal do benefício previdenciário não merece acolhida.

2.3. Termo inicial para incidência de juros de mora e atualização monetária

No que tange ao termo inicial para incidência dos juros moratórios, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 54, segundo a qual "os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual".

Veja-se por pertinente:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA. CADASTRO DE INADIMPLENTES. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. NECESSIDADE. AUSÊNCIA. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. VALOR DA INDENIZAÇÃO. INTERVENÇÃO EXCEPCIONALÍSSIMA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. POSSIBILIDADE. QUANTUM INDENIZATÓRIO MAJORADO PARA DEZ MIL REAIS DE ACORDO COM PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

[...]

O termo inicial dos juros de mora é a data do evento danoso, por se tratar, no caso, de responsabilidade extracontratual, nos termos da Súmula 54 do STJ (STJ, AgRg no Ag n. 1408911/RS. Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 16.02.2012).

Em relação à atualização monetária, o Magistrado singular já fixou o dies a quo na data do arbitramento da indenização, ou seja, da prolação da sentença, razão pela qual não se conhece deste pedido, por ausência de interesse recursal.

2.4. Honorários advocatícios na lide secundária

Por fim, é certo que a seguradora litisdenunciada deve arcar com os honorários sucumbenciais a serem pagos ao patrono do litisdenunciante, uma vez que ofereceu resistência à denunciação da lide, e não simplesmente aderiu à defesa oposta ao autor da demanda.

Diferentemente do que alegou em seu recurso, a seguradora sempre tentou afastar a sua responsabilidade no tocante à indenização por danos estéticos, limitando-a à cobertura dos danos morais.

A propósito:

Deve ser condenada ao pagamento dos ônus sucumbênciais a litisdenunciada que apresenta resistência à denunciação da lide ao buscar limitar o âmbito da cobertura securitária (TJSC, Apelação Cível n. 2008.039384-4, Rel. Des. Monteiro Rocha, julgada em 18.12.2008).

3. Ponto de irresignação comum

Todos os litigantes se insurgem no que diz respeito ao quantumindenizatório fixado pelo Togado a quo. O autor, em seu recurso adesivo, busca majorar os valores das indenizações por danos morais e estéticos para R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) e R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil), respectivamente. Os réus e a denunciada postulam a redução do valor concedido a título de reparação dos danos estéticos.

Sabe-se que a fixação do valor indenizatório deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, de modo que a indenização não seja meramente simbólica, ou exagerada, configurando-se enriquecimento ilícito.

Em relação ao quantum indenizatório, Sérgio Cavalieri Filho pontua:

A razoabilidade é o critério que permite cotejar meios e fins, causas e consequências, de modo a aferir a lógica da decisão. Para que a decisão seja razoável é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano.Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia, que de acordo com seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 6. Ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 116) (Grifo acrescido).

Assim, entre outros critérios, ao fixar o valor da indenização, o Julgador deve considerar a extensão do dano, a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento vivenciado e a capacidade econômica das partes. Ademais, deve-se atentar à dupla finalidade da condenação: ressarcir o lesado e evitar que o causador do dano rescinda na prática do ato danoso.

Neste sentido, Sílvio de Salvo Venosa leciona:

Há um duplo sentido na indenização por dano moral: ressarcimento e prevenção. Acrescente-se ainda o cunho educativo, didático ou pedagógico que essas indenizações apresentam para a sociedade (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 285).

O cotidiano no Judiciário nos apresenta a quantidade elevada de abusos a direitos da personalidade. A essa realidade não devemos nos esquivar. Pelo contrário, reprimi-la-emos. Numa sociedade civilizada, cada pessoa deve entender e aprender a respeitar o direito alheio. O cuidado nas relações sociais deve existir, por respeito ao próximo. Simplesmente assim.

Especificamente a respeito do quantum debeatur, sobreleva pedagógico, punitivo, sancionador. Cabe ao Judiciário reprimir eficazmente a violação aos direitos da personalidade. Nesse campo, uma indenização em valor baixo beneficiará o ofensor, que não se preocupará em "corrigir" o erro, porquanto a mudança de comportamento será mais cara, do que a certeza da pequena condenação nas decisões judiciais.

Nesse panorama, "A indenização punitiva do dano moral surge como reflexo da mudança de paradigma da responsabilidade civil e atende a dois objetivos bem definidos: a prevenção (através da dissuação) e a punição (no sentido da redistribuição)" (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 10ed. Editora Atlas S. A.: São Paulo, 2012, p. 106).

Não é demais lembrar que a verdadeira dor, em toda a sua intensidade dificilmente chega ao conhecimento dos julgadores. O maior sofrimento não cabe em palavras. Por certo é maior do que relatam os papéis contidos no caderno processual. Devemos ter em mente esta realidade para o arbitramento da "justa" indenização.

Para findar o assunto, segue precedente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

"Demora irrrazoável para cancelar serviços não solicitados ou que se tornaram desnecessários, cobranças indevidas, ameaça de negativação do nome etc., constituem práticas abusivas que devem ser repelidas. Vão além dos meros aborrecimentos, gerando efetiva angústia e mal-estar capaz de caracterizar o dano moral em sentido amplo, cuja indenização pode ter caráter punitivo. Entretanto, exige critério apropriado no seu arbitramento, que deve ser feito atentando-se para a gravidade do ilícito, o princípio da exemplariedade e o seu caráter pedagógico (...)" (13ª Câmara Cível, Ap. Civ. 36.495/2007, Rel. Des. Sérgio Cavalieri Filho) (in CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 10ed. Editora Atlas S. A.: São Paulo, 2012, p. 107).

Assim, tendo em vista as particularidades da situação litigiosa, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como o caráter indenizatório e pedagógico do dano moral, entende-se correto majorar o quantumindenizatório para R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Como visto, em razão do acidente o autor sofreu uma lesão cerebral que comprometeu a sua fala e a sua marcha. Os atestados médicos, termos de internação, laudos de avaliação médica, psicológica e fonoaudiológica confirmam que foi submetido a quatro cirurgias, teve depressão, frequentou terapia fonoaudiológica para reabilitação da fala. Acresça-se a tudo isso o intenso sofrimento psíquico decorrente da tragédia da perda da namorada, que o acompanhava no momento do acidente.

Em relação aos danos estéticos, igualmente, o montante estipulado em sentença não se mostra adequado.

Como referido anteriormente, as cicatrizes no rosto, barriga e membros inferiores do requerente, além da alteração da sua fala e na sua marcha, modificaram a sua aparência, a sua imagem, causando contrangimento e prejudicando a sua autoestima. Embora não sejam cicatrizes de grande impacto visual, percebe-se que alteraram a sua imagem de forma negativa.

Assim, o quantum indenizatório deve ser majorado para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

CONCLUSÃO

Diante do exposto, o voto é no sentido de conhecer dos recursos do autor e dos réus, e conhecer parcialmente do apelo da litisdenunciada; negar provimento aos recursos dos réus e da litisdenunciada; dar provimento parcial àquele interposto pelo autor, para majorar o quantum indenizatório referente aos danos morais e estéticos para R$ 100.000,00 (cem mil reais) e R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), respectivamente.

Gabinete Des. Raulino Jacó Brüning

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