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19 de Abril de 2024

TRF-1ª - Turma absolve advogado dos crimes de calúnia e difamação contra magistrado federal:

Publicado por Paulo Antonio Papini
há 9 anos

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região absolveu um advogado da prática do crime de calúnia praticado contra um magistrado federal. A decisão foi tomada após a análise de recursos apresentados contra sentença, do Juízo da 1ª Vara Federal de Jequié (BA), que condenou um advogado à pena de um ano, quatro meses e nove dias de detenção, em regime aberto, pela prática do crime de calúnia.

Consta da denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) que o advogado difamou e caluniou o juiz federal da Subseção Judiciária de Jequié, imputando-lhe fatos ofensivos à sua dignidade e decoro funcionais, além de condutas definidas em lei como crime. Requereu, assim, o ente público, a condenação do advogado pelos crimes de calúnia e difamação.

Em primeira instância, o pedido foi julgado parcialmente, uma vez que o Juízo absolveu o denunciado da prática do crime de difamação, condenando-o, apenas, pelo crime de calúnia. MPF e condenado recorreram ao TRF1 buscando a reforma da sentença. O primeiro sustentou não haver concussão entre os delitos de difamação e calúnia, requerendo a condenação do acusado no crime de difamação, por entender configuradas a materialidade e a autoria.

O advogado, por sua vez, destacou que a Lei 8.906/1994 confere imunidade ao advogado por manifestação no exercício de sua atividade, no interesse de seu patrocinado. Afirmou ainda a não configuração do dolo específico, pois apenas defendeu “de forma exacerbada, seu constituinte, a fim de promover a sua defesa técnica, não tendo, em momento algum, o propósito de ofender a honra do ilustre togado”. Pediu, com esses argumentos, a substituição da pena por medidas restritivas de direito.

Decisão – O relator, desembargador federal Olindo Menezes, entendeu que a prova foi suficiente para demonstrar a certeza da materialidade e da autoria do crime de calúnia, o qual teria absorvido o crime de difamação. “A subsunção dos fatos aos crimes penais da calúnia e da difamação exige a demonstração do dolo específico, da intenção deliberada e preponderante de ofender a honra da vítima, inocorrente na hipótese.”

Ademais, de acordo com o magistrado, “o acusado, advogado no exercício da profissão, embora tenha exagerado nos termos utilizados em suas petições, sem o devido distanciamento emocional dos fatos, raiando (mesmo) pela grosseria em relação ao magistrado regente do processo, fê-lo essencialmente na defesa do seu cliente, sem o ânimo de ofender a sua honra”.

Dessa forma, o Colegiado, de forma unânime, deu provimento ao recurso do advogado e negou provimento à apelação do MPF.

Processo nº 2007.33.08.000994-1/BA

Fonte: Tribunal Regional Federal da 1ª Região e http://www.aasp.org.br/aasp/noticias/visualizar_noticia.asp?id=46277&tipo=D


Comentários sobre a notícia:

Particularmente, não tenho o hábito de comentar notícias que posto, mas neste caso não resisti. É inaceitável, dentre as várias coisas inaceitáveis que há neste país, que vivamos num país que ainda insista em criminalizar a opinião. Acredito, defendo inclusive essa tese, que a imunidade profissional do Advogado não é o análogo à "license to kill" do Sr. James Bond. Todavia, acredito que eventual excesso cometido deva ser, se for o caso, punido através do aspecto financeiro, isto é, uma bela condenação por danos morais.

Acreditar, em casos extremos apenas, que a imunidade absoluta deva ser relativizada [e se usada com abuso, possa vir a ensejar uma pena civil], é bem diferente de aceitar que um Advogado possa ser criminalizado em razão de afrontar criminalmente um Magistrado. Isso é um risco gravíssimo ao exercício da advocacia em sua plenitude, o que, sob qualquer ângulo que se olhe, é um risco concreto ao Estado Democrático de Direito.

Temos que pensar os valores que queremos para a nossa Justiça, que são os valores que desejamos para a sociedade em que vivemos. Se fizermos uma análise rápida dos valores postos em jogo, sob a ótica da proporcionalidade e da razoabilidade, o que é mais sensível à sociedade. A proteção da honra o Direito ao Contraditório e ao Devido Processo Legal, não nos é difícil concluir para a prevalência destes últimos.

Nos parece óbvio que por mais que honras e reputações tenham que ser respeitadas, não é útil, tampouco saudável à sociedade que Advogados comecem a temer o exercício legítimo à defesa de seus clientes, pois podem ser criminalizados pelo excesso que possam vir a cometer na defesa apaixonada de um cliente. É óbvio que o destempero verbal deve ser penalizado, contudo, lendo essa notícia [da absolvição do Advogado] lembro de um caso que vivenciamos certa vez em que uma criança era roubada pelos seus meio-irmãos e na ação de reparação de danos o Advogado se excedeu e proferiu ofensas à parte contrária. Aquelas ofensas apesar de não resultarem num processo criminal, transformaram-se numa ação cível contra o constituinte. Em sede de sentença, o Magistrado, dando muito mais que uma lição de leis, deu uma lição de Direito, na acepção mais pura e bela que acredito ter essa palavra. Escreveu em sua sentença algo como: "[...] a petição inicial não é o melhor exemplo de técnica jurídica, é visível o excesso cometido pelo Advogado na peça inaugural[...], contudo, temos que considerar [dada a gravidade da situação] que há momento em que o Advogado deve optar entre ser educado ou defender seu cliente[...]".

Como dissemos assim, será que é interessante à sociedade que tenhamos Advogados e Jornalistas [profissionais que tem, em última instância, a função de trazer a verdade, a transparência à sociedade] assustados, pois além das agruras normais de seu diaadia [dificuldade de arrumar emprego, clientes que não pagam, processos que demoram, dentre outras] terão que se preocupar e não serem presos e/ou perderem a primariedade? Aliás, em seminário sobre o tema, ficou registrado em paper oficial do seminário[http://www.article19.org/data/files/pdfs/standards/defining-defamation-portuguese.pdf], ficou expressamente consolidado que: "Todas as leis de difamação criminal deveriam ser abolidas e substituídas, quando necessário, por leis apropriadas de difamação civil. Deveriam ser tomadas medidas, nos estados que ainda aplicam leis de difamação criminal, para que este Princípio fosse progressivamente implementado.".

Quando pensamos que o comediante Rafinha Bastos fora obrigado a retratar-se por ter feito uma piada, em tese de mau gosto e ofensiva, contra apresentador de televisão, é algo que, sinceramente, aproxima o Brasil muito mais da Coréia do Norte que da Suécia.

Esse é o argumento a ser capturado. Se é um ato hediondo limitar-se a liberdade de falar de um humorista, mesmo que muitos considerem suas falas repulsivas, o que não é propriamente o tema central dessa discussão, o que não dizermos então de limitarem-se as palavras que devem ou podem ser ditas pelo Advogado no exercício do Direito de Defesa de seu cliente. A criminalização da opinião de um causídico, mormente quando esta é inserta dentro do contexto de uma ação judicial, é algo que vai de encontro o Direito ao Contraditório e a Ampla Defesa, o que, acaba, por fim, sendo inconstitucional por violar o artigo 5, inciso LIV e LV da Constituição da República de 1.988.

  • Sobre o autorAdvogado e Professor. Mestre em Processo Civil
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